A suspensão do pagamento dos aluguéis do edifício Lubrax, sede da Vibra (VBBR3) no Rio de Janeiro (RJ), interrompeu o fluxo de receitas dos certificados de recebíveis imobiliários (CRI) que têm a locação paga pela empresa como lastro e gerou preocupação entre investidores que tinham os títulos de dívida – agora inadimplentes. Especialistas e representantes do mercado se dividem sobre o caso e as consequências para o segmento imobiliário.
Em 2012, a Vibra assinou com a Confidere um contrato para a construção do imóvel no modelo build suit (BTS) – quando o espaço é construído de acordo com as necessidades do locatário. A companhia do segmento de petróleo e gás pagaria o aluguel do espaço até 2031 e, depois, viraria proprietária do prédio.
Para captar recursos para o projeto, a construtora optou pela emissão de CRIs. Nesta operação, a empresa “empacota” e vende as receitas futuras do empreendimento em troca do capital do investidor.
No caso do edifício Lubrax, as receitas futuras – ou recebíveis – seriam os aluguéis pagos pela Vibra, conforme o contrato com a Confidere. “A premissa é a de que o inquilino, caso venha a interromper a locação, fica obrigado a pagar uma multa equivalente a todo o restante do prazo contratual”, afirma Vander Ferreira de Andrade, advogado especializado em direito imobiliário. “No entanto, a Vibra alega existirem cláusulas contratuais que a desobrigam de prosseguir na condição de inquilina” pondera.
Segundo a empresa, o contrato deixava explícito que a Confidere não poderia deixar que o prédio fosse alvo de penhoras judiciais. A construtora, reforça a companhia, descumpriu o acordo e a Vibra teve de arrematar o prédio em leilão judicial, em abril de 2024, por R$ 133 milhões.
A Vibra alega que, como nova proprietária do imóvel, o contrato de locação foi extinto e não há razão legal ou contratual para seguir pagando os aluguéis. Desta forma, o fluxo de receita dos CRIs foi interrompido, gerando a atual discussão no mercado.
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Falta de garantia real no contrato?
Gustavo Ribas, gestor da Navi Capital, vê o movimento da Vibra com naturalidade e chama a atenção para a ausência da alienação fiduciária no contrato – quando o devedor oferece o imóvel como garantia ao credor até o pagamento total da dívida.
“Isso aqui no nosso processo de investimento jamais teria passado. Gostamos de operações de crédito que, se tudo der errado, a gente recupera”, acrescentou o executivo, que participou de painel durante evento da TAG Investimentos nesta quarta-feira (15).
Ribas disse que não chegou a analisar a operação de crédito dos CRIs da Vibra, que prefere investir quando há uma garantia real. Ele explica que o CRI foi emitido colocando como garantia um contrato atípico – que não segue o que está descrito em lei e que coloca termos específicos estabelecidos entre duas partes.
Do ponto de vista legal e jurídico, o executivo diz que a operação parece correta, mas é preciso analisar o caso como um todo. “A discussão é se a companhia se utilizou dessas ferramentas jurídicas que estão previstas no contrato e na legislação, de modo a se beneficiar do spread, porque o nome do CRI era o nome da empresa. Nesse momento, a companhia teve oportunidade de comprar o ativo no leilão e o contrato acabou por terminar”, ponderou.
Outras interpretações para o caso
Amanda Martins, sócia da Canal Securitizadora, tem outra interpretação sobre o caso e defende a manutenção do pagamento de aluguéis do edifício, mesmo após a compra do espaço pela Vibra.
“A operação de securitização é pública, então não tem como alegar desconhecimento [sobre os compromissos da operação]”, pontua. “Na minha visão, o lastro do CRI sendo um BTS, a Vibra deveria continuar pagando o aluguel”, opina.
Ela lembra ainda que muitos CRIs são estruturados com lastro em contrato de locação atípico e não há uma obrigatoriedade em definir garantias para o título. “Claro que a alienação fiduciária reforça o papel, mas você pode ter um CRI clean, sem garantia”, detalha Amanda.
Marcelo Fayh, analista de fundos imobiliários da L&S, vai na mesma linha e avalia que a Vibra é sim parte da operação que financiou a construção do imóvel e, portanto, deveria honrar o compromisso que assumiu com investidores.
“Consta lá no contrato que o valor que a Vibra se comprometeu a pagar por mês para usar o imóvel até 2031 seria cedido aos investidores que estariam financiando este prédio”, pontua. “A Vibra não está pagando um aluguel tradicional, a empresa assumiu um papel de devedora neste contrato”, argumentou o analista, em entrevista ao Liga de FIIs.
Risco para o mercado imobiliário?
Para Fayh, caso a Justiça permita a suspensão do pagamento de aluguéis da Vibra e, consequentemente, a interrupção das receitas dos CRIs, estimulará uma insegurança prejudicial ao mercado de CRIs e ao segmento imobiliário de forma geral.
“Trata-se de um precedente realmente desestabilizador do mercado”, concorda Andrade. “Isso porque os CRIs são anunciados como tendo absoluta garantia e a hipótese em análise está demonstrando que eles não estão livres de riscos ou de tempestades”, aponta.
O advogado lembra que CRIs não possuem garantia vinculada ao FGC (Fundo Geral Garantidor (FGC), mas estão vinculados diretamente ao imóvel. O adquirente (comprador), acrescenta, deveria levar em conta possíveis obrigações decorrentes da aquisição, como por exemplo, remunerar os CRIs.
Em nota, a Vibra afirma que “não descumpriu nenhuma obrigação por ela assumida perante o mercado e não tem relação direta com os titulares dos CRIs”. Confira a íntegra do documento.
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